Publicada na edição de 14 a 21 de novembro de 2013 do Jornal do Trem e Folha do Ônibus da FLC Comunicações Ltda.
Já houve conquista, mas ainda há
questões a se melhorar em relação à inclusão do negro na sociedade brasileira
No dia 20 de novembro é celebrado em
todo o Brasil o dia da Consciência Negra. A data coincide, propositalmente, com
a da morte de Zumbi dos Palmares, para relembrar a resistência dos negros à
escravidão. Durante toda a semana, ocorre na mídia e nos espaços culturais uma
série de discussões e reflexões sobre a inserção do negro na sociedade
brasileira.
Não há como negar que a segregação
racial tem diminuído com o passar dos anos. Hoje, poucas pessoas têm interesse
em manifestar qualquer tipo de racismo, pois sabem que serão, de alguma
maneira, rechaçadas pela sociedade. Com o passar das gerações, cada vez menos
pessoas tendem a ter preconceitos tão ultrapassados como julgar alguém pelo seu
tom de pele.
E
as cotas?
A cada vez maior conscientização da
sociedade têm gerado muitas discussões e reflexões sobre o assunto, o que
culminou na criação do sistema de cotas para negros nas universidades. O tema é
polêmico, pois alguns aceitam bem a iniciativa e outros acreditam ser
desnecessária, por apenas enfatizar o preconceito. O interessante é que, de
alguma maneira, o país está pensando em alternativas para o problema da
educação e as colocando em prática.
O estudante universitário Antonio
Junior acredita que o sistema de cotas é algo válido e importante, porém é uma alternativa
insuficiente. “Preocupar-se com a educação básica é o mais importante, pois não
adianta colocar sal no feijão depois de pronto”, opina.
Violência
contra negros
Recente pesquisa divulgada pelo Ipea
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) indica que ter a cor negra ou parda
aumenta em cerca de 8% a probabilidade da pessoa ser vítima de homicídio. Além
disso, a chance de um adolescente negro ser assassinado é 3,7 vezes maior do
que de um branco, e o número de presos negros no Brasil é 1,5 vezes maior que o
número de brancos. Além disso, enquanto há a média de 1,3 pessoas brancas sendo
agredidas, há a média de 2,3 negros na mesma condição – quase o dobro.
Reinaldo da Silva Guimarães, doutor em
Serviço Social, acredita que o principal passo para reduzir o comportamento
refletido nesses dados é “ensinar as crianças, desde cedo, valores como a solidariedade,
o altruísmo, a tolerância, a diversidade e o reconhecimento de que existem
grupos diferentes entre si – em relação à cor da pele, preferência sexual,
porte físico, etc. – mas que não são inferiores ou perigosos. A transmissão de
bons valores é fundamental para construir uma sociedade mais humana, inclusiva,
tolerante, justa e solidária”.
A
criança negra
Há uma pesquisa norte-americana,
registrada em vídeo, exibe diversas crianças negras sentadas na frente de duas
bonecas, uma negra e a outra branca. O pesquisador pede que elas mostrem qual é
a boneca feia e má, e todos apontam para a negra. Quando a pergunta é qual boneca
é mais legal e mais bonita, os pequenos apontam para a branca. Quando
questionados sobre qual boneca é a mais parecida com eles próprios, respondem
que é a negra. O resultado demonstra que, inconscientemente, essas crianças
acreditam que são inferiores e menos aceitas na sociedade.
Vinicius Almeida, professor de educação
física que atua em escolas públicas, e que recentemente trabalhou com alunos da
Fundação Casa (antiga Febem), acredita que no Brasil uma pesquisa como essa
seria muito mais expressiva e reveladora. “Com crianças e jovens que vivem em contextos
sociais em que há mais brancos, isso é bastante comum. A maioria não aprende com
os pais a valorizar a sua cor e a sua beleza. Como o negro praticamente nunca tem
um destaque positivo na televisão, que querendo ou não é uma das maiores
formadoras de opinião, os jovens buscam referências em padrões que não são os deles”,
o que acaba gerando um sentimento de inferiorização.
O
preconceito velado
Você já reparou na quantidade de negros
que figuram nas propagandas de televisão, nos filmes e nas novelas? Em
comparação às pessoas brancas, ela é praticamente nula – e é algo tido como “natural”,
que poucos estranham. Não se pode negar que há um problema sério por trás desse
comportamento.
Felipe Duarte, um jovem de 25 anos,
conta que sofreu preconceito quando foi comprar o seu primeiro carro. “Eu
entrei na loja, de bermuda e chinelo, e disse que queria comprar um automóvel.
O vendedor me ignorou. Até aí tudo bem, porque eu sai e comprei em outra loja.
O problema maior é o preconceito que eu enfrento no dia a dia, as piadas “sem
maldade” que ouço. Isso faz com que eu tenha que provar que sou bom o tempo
todo. O meu pai acredita que nós, negros, temos a obrigação de andar sempre bem
vestidos, por exemplo. Eu sou tranquilo em relação a isso, mas acredito que o
preconceito velado deva jogar a estima de muitos negros pra baixo”, revela o
jovem.