Publicada
na edição de 27 de setembro a 3 de outubro de 2013 do Jornal do Trem e Folha do
Ônibus da FLC Comunicações Ltda.
“Não tem pobrema, nóis vai na padaria e come
duas coxinha”. Afinal, porque há tanta confusão com a língua portuguesa?
Muitas
pessoas se preocupam em fazer cursos de inglês e espanhol, na intenção de
enriquecer o currículo e ter boas referências. Mas será que compensa dominar
outras línguas e não saber falar o português?
A origem do problema
Não é
à toa que muitos brasileiros têm dificuldades em falar o português. As
orientações de flexionar o verbo de maneiras diferentes no “pretérito
perfeito”, no “pretérito imperfeito”, no “pretérito mais que perfeito”, no
“futuro do presente” e no “futuro do pretérito” leva crianças, jovens e adultos
à confusão – e possibilita que muitos digam coisas como “nós foi”, “nós vai” e “nós
ia”.
O
professor de gramática Fabrício Dutra acredita que o ensino da língua é
deficiente. “O hábito da leitura, tão importante para o entendimento do
português, não faz parte da vida do aluno. A criança passa praticamente toda a
vida escolar sem ler e, pior, sem sentir prazer em ler”.
Principalmente
por ser considerada uma das línguas mais difíceis de aprender, o português precisa
ser trabalhado com esmero nas salas de aula. “Na escola não se estuda a
gramática para aprender a se comunicar adequadamente, mas sim para ‘passar de
ano’. Com isso, surgem dificuldades e dúvidas na hora de falar”, acredita o
professor Dilson Catarino.
Em constante mudança
Ao
invés de dizer “eu a vi” e “eu a conheço”, muitas pessoas dizem “eu vi ela” e
“eu conheço ela”, o que evidência que a língua falada se afasta cada vez mais
da norma culta. “A língua se atualiza diariamente. Expressões são criadas,
significados são produzidos, palavras e formas são inventadas. Já a norma culta
não sofre tantas alterações – e isso não é um problema. Hoje em dia os jovens
têm o hábito de expressar seus sentimentos e ações por meio da estrutura
"#chateado", "#partiu" e isso não quer dizer que a
gramática deva incluir o símbolo "#" em sua estrutura formal”, explica
o professor Fabrício.
Para melhorar
“Ao
contrário do que as pessoas pensam, aprender a língua portuguesa não consiste
em perder horas da vida decorando um conjunto de regras”, brinca Fabrício. O
professor acredita que o hábito da leitura faz com que o falante não encontre
dificuldades em adequar a sua linguagem a uma situação formal, quando
necessário. Já que ler é o melhor remédio, crie ou fomente o hábito de ler uma
notícia por dia, uma revista por mês, um livro por ano.
A
leitura constante faz entender o que é certo e o que é errado no uso da língua.
Dizer "há dez anos atrás", por exemplo, é uma redundância. A expressão
“há”, por si só, já indica o passado. É adequado dizer “dez anos atrás” ou “há
dez anos”. Outro erro constante é dizer "fazem muitos dias", pois o
verbo fazer, quando se refere ao tempo, é impessoal. O correto é dizer “faz
cinco anos”, “fez 15 dias”, etc.
Às vezes, pode
A
língua padrão, também conhecida como norma culta, é o parâmetro para a
utilização do português. Ela pode ser usada de maneira formal ou informal,
dependendo da situação. Em um bate-papo com os amigos, a linguagem coloquial é
melhor a ser utilizada. Afinal, seria estranho ouvir em um bar alguém dizer “duas
cervejas, por obséquio”.
“A
língua deve ser encarada como uma roupa, que deve ser usada de formas diferentes
em situações diferentes. Não se envia uma mensagem de texto no celular de um
amigo da mesma forma que se envia um e-mail para o chefe. Se o funcionário
disser para o superior: ‘o relatório teve vários pobremas, tá ligado?’ será completamente
inadequado”, explica o professor Fabrício. Mesmo fazendo uso da linguagem
coloquial não há motivos para cometer erros de português. Dizer “mortandela” ao
invés de mortadela, “mendingo” ao invés de mendigo, “salchicha” ao invés de
salsicha e “iorgute” ao invés de iogurte são erros brutais.
Todo cuidado é pouco
Já
adverte o ditado popular que “o costume de casa, vai à praça”. Dificilmente
alguém que está acostumado a falar errado consegue, de uma hora para a outra,
passar a falar corretamente. Já pensou se, em uma entrevista de emprego, você
perde a vaga por não saber falar o português? Afinal, poucas empresas estão
dispostas a contratar alguém que não consiga estabelecer uma conversa adequada
com os clientes ou com os parceiros. Não adianta estar bem apresentável,
demonstrar ser uma pessoa agradável e quando abrir a boca liberar inúmeros
erros gramaticais. Considere o domínio da língua como uma vantagem para você.
Do Oiapoque ao Chuí
Em
muitas regiões do Brasil o sotaque e os vícios linguísticos praticamente criam
uma segunda língua, derivada do português. Segundo a professora Graça Reis, os
erros mais comuns variam de região para região. “No nordeste do Brasil, por
exemplo, fala-se "eu lhe amo" ao invés de "eu te amo". Já
na região sudeste os erros de concordância são gritantes. As pessoas brincam
que São Paulo é a terra de “dois pastel e um chopes”. Acredito que,
independente dos erros, o mais importante é que as pessoas consigam se
comunicar. Me lembro de uma tia, por quem sou apaixonada, que diz uma grande quantidade
de erros gramaticais. E eu gosto de cada um deles. Talvez sejam eles que
expressem a identidade dessa tia tão querida”, conta a professora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário