segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Diminua os seus pensamentos machistas

Publicada na edição de 04 a 10 de abril de 2014 do Jornal do Trem e Folha do Ônibus da FLC Comunicações Ltda.

O machismo é tão perigoso quanto o preconceito racial – é a invalidação da mulher por ela ser mulher

Você concorda ou discorda da frase “As mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”? E com a frase “Se as mulheres soubessem como se comportar haveria menos estupros”? Se concordar, pelo menos um pouco, com alguma delas, talvez você precise pensar melhor.
Essas perguntas compuseram uma pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), realizada em âmbito nacional. Em seu resultado, mais da metade do grupo de brasileiros entrevistados, 65%, concordou com a primeira e, 58%, com a segunda. “A aceitação dessas frases evidencia que o machismo é um valor enraizado na sociedade, mas ele não deve ser aceito. Com base no machismo são cometidos crimes, muitos deles hediondos, gravíssimos. Há, no mínimo, a falta de percepção sobre o que está sendo dito”, acredita o sociólogo Aurélio Nascimento.
Todas as pessoas são influenciadas, desde criança, a acreditar em determinadas coisas sem nem pensar. Mas, em algum momento da vida, é preciso parar e refletir sobre aquilo que se acredita. Portanto, façamos um exercício rápido. Afinal, quando falamos de mulheres, falamos de nossas mães, irmãs, filhas e companheiras.

“Merecem ser atacadas”
No dicionário Priberam, há duas definições muito distintas para a palavra merecer. Uma é “atrair para si” e outra é “ser digna de”. Acreditar que uma mulher bêbada, por exemplo, “atraia para si” a possibilidade de um estupro é algo razoável em nossa sociedade, considerando que não há fiscalização ou punição adequada para esse tipo de violência no Brasil. E para piorar, muitos homens acreditam que fazer sexo sem o consentimento da mulher – o famoso “forçar a barra” – é algo normal.
Agora, acreditar que uma mulher bêbada ou que uma mulher que use roupas que mostrem o corpo “é digna” de ser atacada é algo completamente diferente. “Nada justifica a violência”, alerta o sociólogo. Vale a pena refletir sobre o peso das palavras.

“Saber se comportar”
Quanto à segunda frase, é preciso ter consciência de que a sociedade espera que a mulher se comporte de determinada maneira. Muitas vezes, as pessoas são agressivas com aquelas que usam roupas curtas, que não têm um parceiro fixo ou que não queiram se casar e ter filhos. Acontece que qualquer pessoa precisa ser respeitada em suas escolhas, independentemente das imposições sociais. Portanto, dizer que uma mulher sabe ou não se comportar não faz sentido, pois cada um tem o direito de se comportar como quiser.
“Essa pesquisa só pontuou em números o que nós, mulheres, vivenciamos diariamente: o desrespeito”, acredita a assistente social Luciana Catani.
Em relação ao estupro, é preciso refletir que o responsável pelo ato não é a mulher que anda sozinha, nem a mulher que usa roupas curtas e nem a mulher bêbada e desacordada – é sim o estuprador.

Supremacia masculina
Não respeitar os direitos, os desejos e as atitudes das mulheres é anulá-las enquanto seres humanos, colocá-las em um patamar inferior ao dos homens. Esse pensamento asqueroso pode ser comparado ao daqueles que acreditam que as pessoas negras são inferiores as pessoas brancas. Não faz sentido.
Segundo a psicóloga Claudia Sarti, para combater o machismo é preciso educar as crianças de uma maneira diferente. “Atualmente, a maioria aprende que tem um papel a desempenhar na sociedade de acordo com padrões machistas. É importante que os adultos ofereçam outros modelos sociais a elas, mais igualitários”.

Por um futuro melhor
Segundo a assistente social Luciana Catani, “a população feminina precisa ter consciência da condição em que vive. Após se reconhecer enquanto classe oprimida, as mulheres farão a diferença, ensinarão os seus amigos, companheiros e filhos a serem pessoas melhores”.
Assim como ela, o sociólogo Aurélio Nascimento acredita que a luta por um mundo mais igualitário deve começar já. “O que não pode, de jeito nenhum, é permitir que a maioria associe a culpa de um ataque à própria vítima”.

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